Um Dia na Vida dos Catadores
Montenegro, Rio Grande do Sul, Brasil
5h00
Eloi (63 anos), Florentina (57 anos) e seu filho Daniel (16 anos) Tavares acordam e se arrumam antes do sol nascer na maioria dos dias, e hoje não será diferente. Às 5 horas, eles já estão vestidos com os novos uniformes do Projeto Reciclar, que receberam da Global Communities Brasil no dia anterior durante a formatura da capacitação do Projeto Reciclar.
Capacitando Recicladores
A Global Communities Brasil promoveu durante 2022 capacitações com o objetivo da formação de um grupo coeso e melhoria nas condições de trabalho dos catadores, em parceria com líderes comunitários, o Instituto John Deere Brasil, Tanac, Biocitrus Poker, Sicredi e a prefeitura municipal. Além dos encontros na escola do bairro, os recicladores visitaram exemplos bem-sucedidos de cooperativas e troca de ideias sobre como seria uma cooperativa para eles.
As oficinas abordaram temas como relações interpessoais e trabalho em equipe, planejamento financeiro pessoal e familiar, história da reciclagem e dos catadores, redefinição de resíduos sólidos e a importância do trabalho dos coletores.
Os membros também aprenderam competências profissionais como empreendedorismo e a classificação, processamento e organização de resíduos.
Por fim, o grupo participou de sessões de planejamento estratégico para idealizar estratégias de desenvolvimento sustentável para a gestão de resíduos sólidos na sua cidade e planejar o estabelecimento de redes de contatos com atores locais para a gestão integrada de resíduos sólidos municipais.
Os participantes receberam seus diplomas em agosto de 2022.
De acordo com os números:
- 8 parcerias firmadas;
- 26 recicladores certificados;
- 31 participantes receberam equipamentos de proteção individual (EPI) e uniformes;
- 11 recicladores receberam carrinhos;
- Mais de 1.000 moradores na vizinhança.
Enquanto Florentina apronta uma xícara de café instantâneo, Eloi prepara os coletes refletivos laranja brilhante que usarão durante a coleta de materiais recicláveis em Montenegro esta manhã.
Eles tomam alguns goles de chimarrão e conversam antes de calçar as luvas e sair. Hoje, o casal e o filho caminharão vários quilômetros em busca de recicláveis.
"Precisamos conscientizar as pessoas de que colocar lixo em locais inadequados é errado e não faz bem ao meio ambiente.”
Os Tavares fazem parte há muito tempo de uma rede informal de catadores de lixo que passam longas manhãs e árduas horas coletando materiais descartados nas ruas de suas cidades — coisas como papelão, sucata e alumínio.
Os Tavares fazem parte há muito tempo de uma rede informal de catadores de lixo que passam longas manhãs e árduas horas coletando materiais descartados nas ruas de suas cidades — coisas como papelão, sucata e alumínio.
Eles abrem o portão e Eloi empurra seu novíssimo carrinho de coleta, também fornecido pelo Projeto Reciclar. Quando voltarem para casa mais tarde, este carrinho poderá transportar até cerca de 270 kg de materiais. Os carrinhos aumentam sua capacidade de recolher materiais, bem como sua ergonomia durante a coleta, melhorando tanto as suas perspectivas econômicas ao coletar mais, como a sua saúde, ao reduzir os fatores de risco para seus corpos.
Além de receber treinamento para melhorar seu sustento, o grupo, agora composto por 26 famílias, tem trabalhado em conjunto para dividir a cidade em setores a fim de que possam alcançar mais áreas, coletar mais materiais e, de maneira geral, ser mais eficientes como cooperativa.
Eloi, Florentina e Daniel fazem parte de cerca de 800 mil recicladores de lixo que coletam 90% dos materiais recicláveis do Brasil. Ainda assim, continuam a ser em grande medida subestimados nas suas comunidades.
Muitas cidades brasileiras carecem de programas formais de reciclagem, por isso os catadores desempenham um serviço público crucial e têm um papel importante na proteção do meio ambiente.
Esperança para o Futuro
Esperança é a palavra que Pedra Olina da Silva (57 anos) usa para descrever como se sente após se formar nas capacitações do Projeto Reciclar. Durante cinco meses, ela e outros 30 membros da comunidade passaram por capacitações oferecidas pela Global Communities Brasil, em parceria com o Instituto John Deere e organizações apoiadoras.
Antes de participar deste programa, Pedra conta que sua vida era muito mais difícil. “Nossa autoestima estava baixa”, diz ela.
A capacitação foi apenas a segunda etapa do Projeto Reciclar, que já avançou para a terceira etapa ao solicitar oficialmente o status de cooperativa junto à Prefeitura.
Para Pedra e outros membros da comunidade, a cooperativa recém-criada trará oportunidades para um rendimento estável e meios de subsistência dignos.
Hoje, os recicladores percebem seu papel na comunidade de forma diferente e encontram um propósito nas suas contribuições para proteger o meio ambiente por meio da reciclagem, bem como para manter a sua comunidade limpa e saudável.
Para nós, essa cooperativa será muito gratificante, porque a equipe terá um local para trabalhar com materiais recicláveis. Muitas vezes somos discriminados e humilhados nas ruas, por isso a cooperativa vai trazer muita dignidade. Será muito bom para nós.”
7h00
À medida que o sol nasce, os três caminham na beira da estrada, enquanto carros e ônibus passam zunindo. Os coletes de segurança ajudam a mantê-los visíveis para os motoristas, mas eles ainda se preocupam com sua segurança. Enquanto verificam as latas de lixo, os transeuntes observam com diversas expressões — curiosidade, desdém e, às vezes, um sorriso ou um gentil “bom dia”.
Eloi, Florentina e Daniel estão em uma corrida contra o tempo, pois querem coletar materiais antes que os coletores de lixo oficiais da cidade cheguem com seu caminhão. Ocasionalmente, eles têm a oportunidade de interagir e pedir que deixem itens que possam ser reciclados, como este ventilador antigo.
Esta manhã, os Tavares não se depararam com nenhum dos outros catadores do Projeto Reciclar.
Áreas de construção também revelam ser uma boa fonte de materiais recicláveis, incluindo cabos e plásticos.
Algumas casas sabem exatamente como preparar a reciclagem para os catadores. Eloi fica feliz em ver que esta família está com a reciclagem organizada e pronta para ser retirada.
9h00
Por volta das 9 horas, os Tavares saem das áreas residenciais que percorrem e avançam para um setor comercial da cidade. Maria Janete Bernardes Francisco, voluntária do Projeto Reciclar e presidente da cooperativa Projeto Reciclar, se junta a eles e ajuda a colocar Eloi e Florentina em contato com empresários e funcionários da região que poderiam guardar resíduos e trabalhar com eles para reciclar.
Depois de horas de trabalho intenso e de percorrer cerca de seis quilômetros a pé, os Tavares decidem voltar para casa, pois seu carrinho está lotado de materiais descartados. Eles chegam ao seu bairro e são recebidos pelo feliz cachorro da família e também por um alegre “bom dia” dos vizinhos que já estão do lado de fora, aproveitando o sol da manhã.
Eloi puxa o carrinho pesado até o quintal e esvazia seu conteúdo depois de beber um copo d'água, e já começa a próxima etapa do trabalho.
A triagem dos recicláveis é importante tanto para a segurança de suas famílias e vizinhos, como para obter o máximo lucro do seu árduo trabalho de hoje.
Desde que participamos do Projeto Reciclar, aprendemos muito sobre reciclagem e sobre gestão de resíduos. Conseguimos o carrinho e muitas outras coisas, como melhorar nossa capacidade de nos sustentar, por exemplo. Antigamente, nossa renda era muito baixa, mas desde que nos juntamos ao projeto começamos a aumentar nossa renda, o que estabilizou nossa casa [e] nossas despesas financeiras. Conseguimos pagar muitas contas com o dinheiro que ganhamos coletando com o carrinho novo.”
O Projeto Reciclar começou em outubro de 2021 para melhorar as condições de vida e de trabalho dos recicladores na cidade de Montenegro, no Rio Grande do Sul.
A Global Communities Brasil elaborou o projeto em colaboração com os membros da comunidade e é responsável pela sua coordenação e implementação, em parceria com o Instituto John Deere Brasil, Tanac, Biocitrus Poker, Sicredi e a prefeitura municipal.